quinta-feira, dezembro 29, 2005

O Dono do Tempo



Deitado à sombra da olímpica eternidade
Entediado com o rodar
Inquebrável das horas
E porque em baixo
vos excedeis
na corrida contra o Tempo,
Eu, Saturno, ofereço-vos
Uma nova ordem de dias.

Esquecido da velhice eterna
que me cobre os membros
Renasço e faço-me moço
Ao ritmo das estações,
Enquanto vós, na celebração
fugaz como a espuma do vinho
A dissipar-se nas taças,
Aguardais o amanhã
Colorido e breve.

Para vós essa ilusão festiva
Essa ânsia de gozar
A furtiva felicidade
esse travo amargo de sentir o correr
dos dias.

Manuel Guimarães (2005)

quarta-feira, dezembro 28, 2005

Foi há um ano


Depois duma tentativa fracassada de criar um blog no Sapo, acabei por vir ter ao Blogspot, inspirado em alguns blogs de que ouvira falar, muito aligeiradamente. E foi mesmo há um ano que este olhar o mundo «a par e passo» iniciou.
Assim, a reflexão, à gisa de desabafo, a crónica, a crítica, o poema (pela pena tímida do meu outro eu «Manuel Guimarães»), ou então o mergulho na memória da longínqua infância tornam-se texto, neste fundo azul, de tão desinteressado e calmo.
Por aqui foram passando alguns cibernautas, uns quantos tornaram-se frequentadores mais ou menos assíduos e eu sempre na esperança de os ver por cá, lá vou deixando mais um «post».
Entretanto, daqui, fui construindo uma plataforma para viajar para outros blogs amigos, que com a regularidade possível visito e leio.
Quando menos esperava comecei a aceder ao mundo e de todas as partilhas do mundo chegaram sinais de recepção. Entendi, então, que somos cada vez mais concidadãos duma pátria tornada mais próxima e pequena com estas novas ferramentas.
Por tudo que frui desta experiência, creio que vale a pena continuar. Sobretudo, porque vale a pena seguir o curso da vida, vivendo-a e sentindo-a «a par e passo».

sábado, dezembro 24, 2005

Boas Festas


A todos os amigos e a todos quantos cá venham desejo Boas Festas, cheias de saúde, paz e felicidade.
Deixo um abraço a todos vós.

segunda-feira, dezembro 19, 2005

O hipnotizador

De cara vermelha e enfiado na sua longa batina negra o Padre Sousa reuniu cinco rapazes e levou-nos para a sala anexa ao salão de estudo.
Colocou-os encostados à parede dum pálido amarelo. Depois, puxou dum relógio de bolso com as correntes, dum tom de prata, e fê-lo balancear diante dos olhos de um dos moços.
Os outros, em silêncio, com os olhos grandes de espanto e expectantes acompanhavam o pendular compassado do relógio.
Então, com o olhar fixo e penetrante, o padre olhou no fundo dos olhos do pequeno. E disse autoritário e solene:
- Quando contar até três, vais dormir profundamente!
-Um, dois, três!... Dorme! – disse com autoridade.
E o Jorge adormeceu, de pé.
O padre colocou-lhe a mão na nuca, amparou-o e foi-lhe dizendo baixinho:
- Deixa-te cair, estás em casa, aqui é a tua cama…
- E o Jorge foi-se deixando tomar duma imensa sonolência e começou a cair, como se perdesse a consciência e se deixasse adormecer profundamente. Ficou estendido no soalho de pinho, com a respiração pausada de quem dorme um sono profundo.
O padre continuava a questioná-lo se estava confortável. E ele dava um aceno leve. E começava a roncar. O prodigioso clérigo, então, fervia de sucesso.
- Vêem, como ele dorme?! – dizia. - E basta dar dois estalinhos com os dedos e logo acorda! – o seu rosto avermelhava de vaidade.
No pensamento de Nel, no entanto, persistia uma dúvida. Se o padre tivesse de sair e o Jorge não voltasse a acordar? Apoquentava-o o medo de o padre os mandar dizer alguma coisa que não se pudesse saber, debaixo do torpor da hipnose…Ou pior, se ele se esquecesse dos gestos e das palavras mágicas e um deles ficasse para sempre no reino do sono.
Mas nada disso aconteceu. O padre Sousa, deu os estalidos com os dedos e o Jorge acordou, esfregou os olhos e disse apatetado:
- Que foi? onde estou?
Dias depois, porém, a sessão foi diferente. Desta feita a vítima foi o Freitas.
- Acorda! - disse o padre, depois de dar dois estalidos com os dedos. Mas o Freitas não acordava e continuava num roncar perfeito, mesmo de pé.
O Padre tentou mais uma e outra vez. Mas ele continuava naquele sono estranho, como as aves no poleiro. Então o padre, aflito, afastou-se e puxou dum livrinho e releu as fórmulas mágicas. E voltou para junto do estudante, mas agora em vez dos estalidos, foi mesmo um par de estalos que cantaram pelo longo corredor. No salão de estudo todos ouviram o grito do Freitas, que saiu a correr, desaustinado, da sala de arrumos que servia de laboratório ao aprendiz de hipnotizador.
E em todo esse dia na cara bolachinha do Freitas se notaram as marcas dos dedos do severo hipnotizador. A simulação do sono saiu pesada ao Freitas, mas o padre não apanhou mais nenhuma vítima para as suas sessões.
Os rapazes, daí em diante, esgueiravam-se da sua presença e só o toleravam a uma prudente distância, não fosse o seu instinto hipnotizador vir escolher outra vítima.
Manuel Guimarães, Odisseia da Memória(2005)

domingo, dezembro 18, 2005

Os meninos que nós fomos


Olho para a fotografia e não deixo de pensar nos tenros anos da minha infância. Como tão pouco nos fazia felizes! Com um sorriso, uma réstia de imaginação e não havia brincadeira mais gostosa!

Pelo acordar da memória, fico grato ao Museu Etnográfico de Vilarinho das Furnas: o memorial que eterniza um povo que provou aos governantes paternalistas do Estado Novo que estava preparado e sabia usar da democracia.

A Formosura desta fresca serra



Numa breve mas gostosa passagem pelo Gerês, nesta amena tarde de domingo, evoquei Camões, que tinha olhos, alma e arte para amar a natureza.


A fermosura desta fresca serra,
e a sombra dos verdes castanheiros,
o manso caminhar destes ribeiros,
donde toda a tristeza se desterra;

o rouco som do mar, a estranha terra,
o esconder do sol pelos outeiros,
o recolher dos gados derradeiros,
das nuvens pelo ar a branda guerra;

enfim, tudo o que a rara natureza
com tanta variedade nos ofrece,
me está (se não te vejo) magoando.

Sem ti, tudo me enoja e me aborrece;
sem ti, perpetuamente estou passando
nas mores alegrias, mor tristeza.
Luís de Camões, Lírica.

segunda-feira, dezembro 12, 2005

O homem disse que ia abrir o livro

Chegaram todos,
Por trás da mesa apinhada de microfones
O homem sentou-se na cadeira e disse:
- Vou abrir o livro.

Depois fixou o olhar na câmara,
Levou a mão aos óculos,
Compô-los melhor
E começou a olhar para um papel branco
que tremia leve
na mão papuda.

-Vou abrir o livro!
repetiu e voltou a ler em silêncio o imenso
papiro branco
salpicado de sinais
e laivos de saliva.

E do outro lado da mesa,
Faiscante irrompia o cliquar das câmaras,
Dos telemóveis.
E quanto mais a onda mediática
Crescia mais o olhar fundo do homem se perdia
Na imensa brancura da folha
Branca.

Então, desfiou um interminável solilóquio
De caóticas sequências verbais
Que só pareciam coerentes
Porque seguiam a cadeia fónica dum discurso
blablablablablBLABLABLA!blablabah!!

De vez enquanto parava
Na esperança de ter arrancado algum aplauso.
Depois voltava:
- hoje vou abrir o livro.
E repetia um a um os gestos
Numa cadência cíclica.

Por fim,
O discurso fez-se noite
Obscura de razões
perdidas num silogismo qualquer.
E o livro aberto
Não tinha mais do que o acento esdrúxulo
Da catástrofe
Do homem que prometia abrir o livro.
M. Guimarães (2005)

quarta-feira, dezembro 07, 2005

Novo espaço na blogosfera

Iniciou a sua actividade o http://registos-espl.blogspot.com/. Este espaço destina-se a divulgar o que se vai fazendo na Escola Secundária da Póvoa de Lanhoso. É um espaço cheio de novidades, com fotos, com notícias, com temas de discussão. Se és, ou foste estudante ou docente da ESPL passa por lá, comenta e divulga-o juntos dos teus colegas. Eu também vou estando por lá.

segunda-feira, dezembro 05, 2005

Retalhos do nosso Minho


E ao dobrar duma curva ei-lo altivo, elegante e airoso o vetusto mosteiro de Rendufe, em Amares.
Só é pena que o edifício habitado pelos frades ainda tarde a ver a recuperação necessária, antes que o tempo deite tudo a perder.