domingo, janeiro 30, 2005

Com o mar ao fundo

Albufeira, 1981

Revisitar a memória, com a ajuda da imagem, é sempre um exercício curioso de nostalgia e de espanto. Ao Jorge , ao Francisco, ao Sérgio, se me vistarem neste blog, um abraço.>

sábado, janeiro 29, 2005

Tibete


Foto enviada por Anabela Dalot

Escapar para longe
aspirar o ar rarefeito
enlevar-se numa comunhão profunda
com o supremo e limpo silêncio
e sentir nascer na alma a paz
do tempo primordial

quinta-feira, janeiro 27, 2005

Porto Romântico


O Porto, antes do Douro ter sido abraçado e apertado por pontes de ferro e betão, era uma aldeia grande que em gérmen pululava de vitalidade. O mar ao fundo, as veredas a debruçarem-se viçosas sobre as águas límpidas. Aqui e ali branquejavam as vivendas e palacetes de brasileiros e ingleses, por entre velhas árvores generosas, que com suas sombras convidavam homens e damas, em dias de calma, a um devaneio romântico. Assim o sentiram Garrett, Camilo,Júlio Dinis entre outros.

segunda-feira, janeiro 24, 2005

Nem rei nem lei

A situação portuguesa actual poder-se-sá comparar à que Fernando Pessoa muito sabiamente diagnosticou no início do século XX:

QUINTO / NEVOEIRO
Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer--

Brilho sem luz e sem arder,
Como o que o fogofátuo encerra.
Ninguém sabe que coisa quer.
Ninguém conhece que alma tem,

Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.

Ó Portugal, hoje és nevoeiro...
É a Hora!

Fernando Pessoa, Mensagem

sexta-feira, janeiro 21, 2005

Quem socorre aos nossos pinhais?

posted by Rui Sousa

Esta imagem é um testemunho do que está a acontecer a muitos pinhais. Em pouco tempo árvores adultas com aspecto saudável começam a degenerar e morrem. Há alguma coisa que tem de ser feita, para que não fiquem na paisagem apenas as ossadas nuas de árvores altivas.



Viver enlatado

Recebi na minha caixa de correio esta animação preciosa, que reflecte a tensão vivida em muitos espaços deste país e de muitas cidades do globo.
http://www.bozzetto.com/neuro.htm.

quinta-feira, janeiro 20, 2005

Onde fazer delete?

Estou assombrado com a delicadeza dos nossos políticos. Alguns deixam-nos estupefactos.
Imagine-se um criminoso que aduz para sua defesa o facto de no passado outros terem cometido tantos crimes como ele e terem passado incólumes.
Agora, pense-se nas inúmeras nomeações que se vêm fazendo para satisfação de clientelas . E - surpresa! - tudo está bem porque outros já o fizeram atrás!
Onde está o «delete» para apagar de cena estes políticos?

quarta-feira, janeiro 19, 2005

Eugénio de Andrade, poeta do sol

Hoje faz anos Eugénio de Andrade, o anónimo José Fontinhas, que a poesia converteu num gigante das Palavras. A sua poesia brota da terra, aquece ao sol, e dá-se em frutos e no toque das flores. Lê-lo é fazer-lhe a justa homenagem.

domingo, janeiro 16, 2005

Feira do fumeiro

Vermelho e macio, com ligeiro sabor a fumo, temperado, sem ser salgado, enxuto, sem ser seco, exalando os ancestrais aromas dos nacos de carne suína, semi-bravia, assim se provou o presunto e o fumeiro Montalegrenses.
Pela oportunidade de reencontrar os sabores genuínos portugueses, bem hajam as gentes do Barroso.


quarta-feira, janeiro 12, 2005

O velho que escrevia poemas de amor


O velho que escrevia poemas de amor
Tomou a lira
E desfez-se em canto
Buscou a vida na tessitura do verso


E quando, enfim, tudo parecia certo,
Dando corpo aos sentimentos em beijos
Numa tensão real

Veio o vento
E arrancou-lhe das mãos
Uma a uma as folhas polidas dos versos
E deixou-lhe apenas o papel branco
Da sua imensa angústia.


Vencido, quebrou a lira, rasgou os versos
E ficou olhando na lonjura
A grandeza da sua ilusão.
Manuel Guimarães

terça-feira, janeiro 11, 2005

Serenata de Belisa

Por las orillas del río

se está la noche mojando

en los pechos de Lolita

se mueren de amor los ramos.


¡Se mueren de amor los ramos!


La noche canta desnuda

sobre los puentes de marzo.

Belisa lava su cuerpo

con agua salobre y nardos.


¡Se mueren de amor los ramos!


La noche de anís y plata

relumbra por los tejados.

Playas de arroyos y espejos

anís de tus muslos blancos.


¡Se mueren de amor los ramos!

Copyright ©Federico García Lorca (in Poetas e Trovadores).

sexta-feira, janeiro 07, 2005

Fábula em mirandês

L burro
Era ua beç Nosso Senhor que habie criado l mundo i todos ls animales: las cabras, las canhonas, las bacas, ls cabalhos, ls cochinos, ls perros, ls gatos, ls liones, ls tigres, ls alifantes, ls ratos, las lhiêbres, ls coneilhos, buôno, todos, todos...
Bai adespuis de ls haber criado, fize-los passar todos por an pie del i íba-le ponendo a cada un sou nome:
- Tu sós baca, tu sós bui, tu sós oubeilhs - tu sós lion, tu sós cabalho, tu sós jumento, dixo pa l burro, i tu sós gato, i tu cuneilho i tu cabra i tu chibo, i fui assi ponendo a todos l sou nome, até que se acabórun.
Bai anton l jumento çqueciu-se-le l sou nome. Inda ls outros animales nun habien acabado de recebir ls sous nomes i yá l jumento staba a apartar cun ls outros para que l deixássen achegar-se a Nosso Senhor para saber cumo se chamada.
Quando anton se achega a Nosso Senhor, cun cara de asno a perguntá-le:
- Oh meu divino Mestre, eu cumo me chamo que já se me çqueceu?
Bai Nosso Senhor anton puxou-le pulas oureilhas, até que se quedou cun las oureilhas grandes i dixo-le assi:
-Tu és burro!...que já não te lembras do teu nome.
L apuis l burro quedou-se a chamar burro i siêmpre cun las oureilhas grandes.
in La boç de las palabras mirandesas

Arrebatado de http://www.jumento.blodrive.com.

quinta-feira, janeiro 06, 2005

A pressa é má conselheira

Sinto-me traído. Quando vejo que na próxima legislatura os deputados previsivelmente eleitos pelo distrito de Braga pouco ou nada têm em comum com Braga. Dá vontade de recordar o livro de José Saramago Ensaio sobre a Lucidez. Ver Sónia Fertuzinhos nada e criada na terra de Vimaranis ser relegada para o 12.º lugar numa lista, é gozar com todos nós. Estamos perante um regime político caduco: já não é a democracia, é a partidocracia. No entanto, é de lembrar que todos os regimes assentes em bases falaciosas hão-de ser devorados pelo tempo. Podem crer. Ainda hei-de assistir a isso. A democracia precisa de ser reinventada.
Valete fratres.

Nau abandonada



Na pequena baía quase fechada
Sob uma lua fria e branca
Dorme exangue e lassa a velha nau
De epopeias velhas e gastas

Agora roída e frágil
Esperando que uma vaga
Mais forte a submeta e alague

Os mastros outrora altivos e ágeis
Vergaram quebrados
O leme imobilizado
Perdeu todos
Os nortes

E mesmo a popa que soberba
Se enchera de brios e honra
É um palco triste de desolação

À volta os sujos sargaços
E o cheiro nauseabundo da vaza
do mar pútrido enredam o corpo da nau
coberto de musgo velho e sujo.


Que foi feito do capitão nobre e leal,
E da sua energia, e da sua aventura,
e da sedução de todas as sereias
Que nos portos do mundo lhe acenaram com seus maviosos cantos

Certamente, encalhou numa vida qualquer de pequenas rotinas,
Contabilizando imagens e parcos proventos
Que lhe sustentam até ao fim a fome de vida.

M. Guimarães

quarta-feira, janeiro 05, 2005

A magia da neve

Quando recentemente subi até Montalegre, o frio apertava, mas a magia e o encanto da paisagem vestida de branco superavam o desconforto. Por isso a balada da neve de Augusto Gil permanece viva.

postado por Manuel



terça-feira, janeiro 04, 2005

Inutilia truncat

Depois da exuberância barroca, de todos os excessos da forma e da empolação de conceitos, é importante retomar o rigor clássico. Assim, por que não recomeçar este ano, nas aulas de literatura, com a máxima arcádica «Inutilia truncat»?
Na vida também é necessário este acto de higiene pública, de limpeza de excessos. Há que libertar o corpo e a alma dos excessos que nos prendem os movimentos. Uma mente embaraçada de peias, de preconceitos, de falácias não julga livremente. No entanto, todos os dias se nos impõem escolhas que se pretendem livres e consequentes.
No discurso dos políticos, em tempo de arraial e bazar demagógico, só nos resta este exercício tão simples e tão necessário: cortar o inútil, ver para além da nuvem de fumo em que se enovelam os protagonistas e bonifrates da nossa opereta triste. Isto, porque se não houver uma nova atitude política, sujeitamo-nos a assistir em náusea a um final trágico-cómico.
Precisamos cada vez mais da nudez da verdade, sem hesitações, e depois reconstruir sobre bases sólidas a nossa vida comunitária a nova «república».